top of page
  • Writer's pictureTheodora

Horácio Costa | 23 versos | 23 lines




23 versos

Hoje é o primeiro dia de quarentena em São Paulo.

Uma cidade igual a dois países

ou uma vila igual a uma vila

nunca entra em quarentena.

Os cães não deixam de ladrar. Voam os pássaros.

Os cabelos dos cadáveres

suas unhas

não param de crescer depois

que desce o caixão e os vivos

começam o seu milimétrico trabalho 

de esquecimento.

O próprio esquecimento nunca deixa

de fazer o seu trabalho.

Não entra em quarentena.

Olho pela janela e quase nada se move.

Não há aragem neste amanhecer.

As árvores lá embaixo sequer balançam.

Uma moto e seu condutor de capacete negro

avançam

lentamente

pela rua.

Assim como o esquecimento,

o vírus não entra em quarentena.

24 III 2020

Horácio Costa



23 Lines

Today is the first day of quarantine in São Paulo.

A city like two countries —

or a village like a village —

never quarantines.

The dogs do not stop barking. Birds fly.

The hair of corpses

and their nails

do not stop growing after

descent in the coffin while the living

begin their millimetric work

of forgetting.

Forgetfulness never stops

doing its job.

It does not quarantine.

I look out the window. Almost nothing moves.

It is dawn. There is no breeze.

The trees below do not even sway.

A motorbike and its black-helmeted driver

proceed

slowly

down the street.

Just like forgetting,

the virus does not quarantine.

24 III 2020


Translated by Chris Daniels





Horácio Costa (São Paulo, 1954) é um poeta, ensaísta e professor universitário brasileiro (USP). Graduou-se pela Universidade de Yale (1994), e ensinou por muitos anos na Universidade Nacional do México. Sua poesia foi traduzida para dez línguas, e inclui 12 livros de poesia publicados em português. Uma antologia compreensiva dos seus poemas, Fracta – Antologia Poética, com curadoria de Haroldo de Campos, apareceu em 2004 no Brasil (Editora Perspectiva), e no México (Fondo de Cultura Económica, 2008). Em 2014 ele ganhou o  Prêmio Jabuti, de maior prestígio no Brasil, por seu livro Bernini (São Paulo, Sêlo Demônio Negro, 2013). Seu livro de poemas mais recente é A Hora e Vez de Candy Darling (Goiânia, Martelo, 2016). Horácio Costa é homossexual e vive em São Paulo with seu marido Francisco e seus dois cachorros, Filipa e Achado. 

Horácio Costa (São Paulo, 1954) is a Brazilian poet, essayist and university professor (USP). Graduated from Yale University (1994) and has taught for many years at the Mexico National University. His poetry has been translated into ten languages, and includes 12 books of poetry published in Portuguese. A comprehensive anthology of it, Fracta – Antologia Poética, curated by Haroldo de Campos, has appeared in 2004 in Brazil (Editora Perspectiva), and in Mexico (Fondo de Cultura Económica, 2008). In 2014 he won the Prêmio Jabuti, the most prestigious in Brazil, for his book Bernini (São Paulo, Sêlo Demônio Negro, 2013). His most recent poetry book is A Hora e Vez de Candy Darling (Goiânia, Martelo, 2016). A homossexual, Horácio Costa lives in São Paulo with his husband Francisco and their two dogs, Filipa and Achado. 

126 views0 comments

Recent Posts

See All
bottom of page